quinta-feira, setembro 13, 2007

José Cid


"Tenho melhor currículo do que a ministra da cultura"

Atende o telefone no carro, a caminho de um concerto. José Cid tem 65 anos, mas os anos não parecem ter passado por ele. Responde à entrevista com a bravura de sempre. Mas ressalva: "Não contesto; constato". E nem reclama por ele, assegura. "Defendo os interesses de um colectivo".

[Entrevista de Helena Teixeira da Silva publicada a 18 de Agosto de 2007 na série Farpas do Jornal de Notícias]

É mesmo homofóbico?

Não critico a sexualidade de ninguém, mas não me atirem essa diferença à cara. Heróico não é dois homens casarem; heróico é um casal lutar neste sistema político de merda para sustentar os filhos.

Nos anos 90, posou nu para a capa de uma revista. Voltaria a fazê-lo?

Não posei nu, tinha um disco de vinil à frente. O meu número de fãs aumentaria muito se tivesse sido nu integral. Tenho um corpinho invejável. Só o meu espelho e poucas pessoas o sabem.

Na altura, fê-lo para constestar a ausência de música portuguesa nas rádios. Está satisfeito com a nova lei?

As pessoas que fazem as playlists nas rádios pretendem ser mais vedetas do que os próprios criadores. O meu recente ábum "Pop rock & vice versa" podia passar em qualquer rádio do mundo e não passa em nenhuma rádio em Portugal.

Ainda hoje se fala desse nu. Portugal é um país pudico?

É um país de voyeurs. Fui à televisão por causa disso. Em "A noite da má língua", Miguel Esteves Cardoso disse que eu precisava ser reciclado. Respondi: "Eu ainda me escondi com um disco. A ti, se calhar, bastava uma caneta".

Depois da ausência teve um regresso mediático. Foi a cereja no topo da carreira?

Não estive ausente. Gravei álbuns nos anos 90 que aconselho as pessoas a procurarem. Em 2000 houve um 'comeback' porque as novas gerações descobriram que havia uma obra boa a ser ignorada.


Também parece seduzir uma imensa fatia de "tias"...

Gostam de mim. Foram educadas a ter bom gosto. Não as recuso, como não recuso as pessoas humildes que me seguem pelo país.

Ainda gostava de ser ministro da Cultura?

Tenho melhor currículo cultural do que o da actual ministra. E no PS há homens – Manuel Alegre ou Mega Ferreira – melhores do que ela e nunca foram nomeados.

Carmona Rodrigues assistiu ao seu concerto no Maxime. Votou nele para Lisboa?

Não sou republicano. Defendo um sistema monárquico como o espanhol. Eles defendem intransigentemente a sua cultura. Nós somos muito abertos ao que vem de fora.


O que é ser monárquico e anarquista numa República?

Não sou anti republicano; não sou é republiqueiro. E isto parece a república de bananas. O ministro da Saúde não fala com médicos; a ministra da cultura não é culta; a da educação não dialoga com professores. E o Primeiro-Ministro não vai a manifestações populares para não se misturar com o povo. Não é sistema de que goste.

Há frases suas para a posteridade: a de Madonna ou Elton John. É o rei dos sound bytes?

É uma forma de chocar as pessoas. De dizer: "Portugal tem identidade própria. Não façam misturas". Não sou o Elton John português. Já tocava piano e cantava antes dele aparecer. Alguém imagina os Rolling Stones a nascerem em Almada? Ou o Júlio Iglésias a nascer em Penafiel? É óbvio que não teriam tido a mesma carreira.


Há frases de que se arrependa?
Uma única: "Como um macaco gosta de banana eu gosto de ti.

Em que circunstâncias ameaça abandonar o palco?

Como não tenho uma máquina que põe 10 gorilas à frente do palco, às vezes, ele é invadido por miúdos aos gritos. Sem condições não canto. Mas também não amuo. Retiro-me e volto depois.

Tony Carreira é o seu ódio de estimação. Porquê?

Não é da pessoa que não gosto. A minha empregada até acha que ele é lindo. Mas não é justo que ocupe o espaço que deveria ser preenchido com os cantores que, em Portugal, têm uma poesia e estéticas fabulosas. Ele não faz música popular; faz música populosa – um misto de popular e piroso.

A que estrela pop portuguesa daria aulas de música?

A todos os que cantam em inglês sem saber inglês. Pelo menos, entreguem a ingleses, que pensam em inglês, os seus monstros poéticos. Os Gift e o David Fonseca tiveram mais sucesso a cantar em português, a língua de Torga, o tal que a ministra esqueceu. Uma vergonha.

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